segunda-feira, novembro 27, 2006

Considerações finais

  • A condição de “interioridade” resulta hoje mais dos processos históricos que levaram ao estado actual do que de falhas estruturais actuais ao nível da dotação de infraestruturas[1]. As falhas estruturais encontram-se a outros níveis, explorados no presente trabalho;
  • “Plano de Intervenção em Espaço Rústico” seria uma nomenclatura mais condicente com os objectivos e conteúdos dos planos desta natureza[2];
  • As áreas rurais necessitam de tanta intervenção municipal ao nível do mercado de solo quanto as áreas urbanas, havendo no entanto algumas especificidades particulares;
  • Dados expedientes como o conhecido por "ruínas espanholas", a existência de cadastro é fundamental para o correcto planeamento das áreas rústicas;
  • Devem ser regulamentadas as ruínas, numa perspectiva de que nem todas poderão ou deverão conferir direitos de edificabilidade;
  • Não é admissível a permissão de edificação fora de perímetros edificáveis por razões ponderosas de ordem económica, uma vez que estas razões só encontrarão fundamentação perante um cenário de demissão pública de princípios constitucionais[3];
  • A permissão, ainda que condicionada de edificação fora de perímetros edificáveis, retira a possibilidade de aquisição para usos agrícolas ou florestais, já que o preço do solo é sempre influenciado por "mais valias expectáveis"[4].
  • A capacidade de apropriação das maiores mais valias directas possíveis, muito superiores às resultantes do licenciamento de um loteamento em espaço urbano, por o solo ser à partida, rural, atrai de sobremaneira investidores para entesouramento;
  • É obrigação destes IGT a salvaguarda e valorização de valores ambientais, não só pela proibição de actividades lesivas daqueles valores, mas também através da demonstração do valor económico de actividades que os potenciem;
  • A maioria das disposições dos PIER com vista à conservação da natureza tornarão desnecessário o licenciamento directo do ICN para as actividades, usos e respectivas intensidades, quando regulamentadas;
  • A segunda habitação não deverá ser encarada à partida como uma patologia, mas como uma realidade a enquadrar devidamente em sede de planeamento;
  • O PIER poderá enquadrar jurídica e administrativamente reparcelamentos, seja no âmbito de ZIF, perímetros de rega ou de outros perímetros em áreas rurais;
  • Não fará sentido, na maior parte dos casos, um PIER com menos de 1000 ha, seja porque numa área menor dificilmente se encontrará massa crítica para o desenvolvimento do plano, seja porque dificilmente se encontrarão as complementaridades necessárias ao equilíbrio entre ocupações e usos do solo;
  • Não faz sentido que, dada a inexistência de um plano análogo ao PU[5] para o espaço rural, o PIER seja obrigatoriamente omisso no que concerne à regulamentação de perímetros urbanos, que estruturam o espaço rústico;
  • A introdução de certas obrigações construtivas, seja para o aproveitamento de água pluvial, seja para o aproveitamento de fontes de energia locais é de fácil implementação e aceitação, uma vez que é igualmente vantajoso para os utilizadores das edificações;
  • A utilização de soluções pesadas (mecanizadas) de tratamento de águas residuais deverá ser evitada, utilizando soluções como “leitos de macrófitas” ou tratamentos similares;
  • O conceito de capacidade de carga referido na portaria que regulamenta os PIER deverá ser aplicado apenas em sede de proposta, não fazendo sentido a sua consideração no âmbito da caracterização, a não ser para denunciar situações de ruptura;
  • A definição de categorias e subcategorias uniformes aplicáveis a todo o território, tal como previsto no RJIGT poderá truncar o desenvolvimento de qualificação adequada ao caso concreto[6];
  • Para a regulamentação das actividades agro-florestais são passíveis de transposição inúmeras “boas práticas” agrícolas e silvícolas, que em sede de PIER beneficiarão do regime contra-ordenacional do RJIGT[7];
  • A multiplicação de competências e atribuições entre organismos da administração é particularmente complexa em meio rústico;
  • A parafernália de legislação aplicável torna extenuante a tarefa de produção regulamentar para estas áreas;
  • A abordagem a estes planos terá de passar por um grande envolvimento da população local, numa perspectiva criativa visando a capacitação das populações locais (empowerment);
  • A chave do desenvolvimento do interior e das áreas rústicas não está no planeamento do território, mas este terá de estar adaptado a suportar aqueles processos de desenvolvimento;
  • A abordagem "clássica" do planeamento urbano é desajustada ao planeamento do espaço rústico, mas representa sem dúvida um contributo fundamental para o desenvolvimento daqueles espaços.


DESENVOLVIMENTO ====>> ENVOLVIMENTO



[1] João Ferrão (2002).

[2] O mesmo tipo de confusão conceptual existe ao nível no PNPOT, uma vez que se entende o programa muito mais perto do projecto, a política no topo da hierarquia, e o ordenamento do território como um estado actual (não necessariamente o desejado) do território. A manutenção de ‘intervenção’ justifica-se para este plano pela sua vertente estratégica, que deve concretizar.

[3] Artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa, “Habitação e Urbanismo”

[4] “Floating value” (Paul Balchin et al, 2000)

[5] Com a alteração do RJIGT pelo Decreto-Lei 310/2003 de 10 de Dezembro, “O plano de urbanização define a organização espacial de parte determinada do território municipal, incluída em perímetros urbanos, podendo englobar solo rural complementar que exija uma intervenção integrada de planeamento.”

[6] Para ultrapassar as limitações decorrentes da regulamentação da qualificação do uso do solo propõe-se a elaboração de "tabelas de conversão" que permitam a consideração à escala supramunicipal das qualificações do solo, para fins estatísticos ou de planeamento.

[7] Este devia prever para as violações do plano o que prevê para as violações de medidas preventivas, nomeadamente no tocante à "reposição da configuração do terreno ou a recuperação do coberto vegetal" (nº 2 do artigo 114.º)